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A vida perde o sentido

Quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013, um canal de televisão tem a brilhante de ideia de mostrar, poucos minutos antes do duelo tricolor no Engenhão, quatro ou seis crianças de cinco a oito anos brincando com uma bola nas dependências do estádio. Quatro ou seis garotos com camisas de times adversários que sorriam chutando uma bola azul que teimava quicar no chão. Mais brilhante ainda foram as sábias palavras dos apresentadores: “Este é um momento para ficar na história. Isso é o poder do futebol”. Uma quarta que começara com Champions League e se findaria com um duelo de gala na Taça Libertadores. O futebol faz sentido, a vida faz sentido.

“Se findaria”. Aquela quarta não acabou e nunca vai acabar. Quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013, em um outro canal de tv, uma criança não corre, mas é socorrida. Não tem os mesmos cinco ou oito anos, mas adentra a sonhada adolescência. Não é tricolor, nem do sul, nem do rio, é San, de San José, boliviano, que há pouco anos aprendeu que quando uma bola ultrapassa a linha é gol, é hora de gritar, de comemorar. Recente aluno de uma escola em que se levanta bandeira, onde se carrega uma paixão, se movem corações e se ultrapassa a fé. Menino, que como nós, foi presenteado pelos pais na infância com a camisa do time de coração. Que canta, que xinga, que vai ao estádio, que chora e ri pelo simples gesto de ver a bola balançar uma rede. Que é carregado, que perde sangue e que luta pela vida. Que não resiste, que morre, ali onde lhe ensinaram que a sorte costuma estar presente. Não a dele. Morre. O futebol perde o sentido, a vida perde o sentido.

Quantos de nós já não presenteamos sobrinhos e filhos com camisas e bolas de nossas paixões? Quantos de nós já não sonhamos levá-los aos estádios? É lindo ver o filho gritar o nome do time, que assim como ele, você ama. E o que o pai de uma criança pensa neste momento? A dor, a incerteza e a perda o cerca. Fatalidade, torcida, culposo, doloso, Corinthians, sinalizador, enfim, nada mais importa. Uma vida chegou ao fim aos 14 anos de idade, pouco depois do apito inicial. Não nas praças de guerras do mundo, mas em um estádio de futebol, aonde certamente procuramos a alegria, um garoto boliviano encontrou a morte, o fim. E não morre o menino, morrem os pais, a torcida, a cidade, morrem os avós, tios, irmãos, amigos, morre eu, morre você, morre o futebol.  



Em homenagem ao menino Kevin Espada, de 14 anos, que morreu durante a partida entre San José e Corinthians pela Libertadores. Kevin teve perda de massa encefálica por ter sido atingido por um tubo plástico de um rojão soltado pela torcida adversária. 

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